MALÁRIA

Funasa: Malária

Paludismo, Febre Terçã Benigna, Febre Terçã Maligna, Febre Quartã (P. malariae), Maleita, Sezão

Agente Etiológico

A malária é causada por uma das 3 seguintes espécies de plasmódios:

  • Plasmodium malariae;

  • Plasmodium vivax;

  • Plasmodium falciparum.

Em áreas com ↑ transmissão de malária, onde coexistem o Plasmodium falciparum e Plasmodium vivax, é detectada a associação dessas espécies no exame de amostra de sangue.

Reservatório

O homem é o único reservatório importante da malária, embora os macacos possam albergar o P. malariae.

Vetores

Os transmissores da malária são insetos da ordem dos dípteros, da família Culicidae e do gênero Anopheles. Os anofelinos são pequenos dípteros, medindo menos de 1cm de comprimento com corpo delgado e longas pernas que lhe valeram o nome de "pernilongo", "muriçoca" ou "mosquito-prego". A maioria dos anofelinos tem hábitos crepusculares ou noturnos. Ao crepúsculo, movidas pela necessidade de sangue, as fêmeas saem em busca de suas fontes alimentares: animais ou homens. As espécies que procuram principal ou unicamente o sangue de animais (mamíferos, aves) são qualificadas pela maioria dos especialistas como "zoófilas", enquanto as que picam preferencialmente o homem são ditas "antropófilas".

Certo grau de antropofilia é condição fundamental para que uma espécie de anofelino seja boa vetora de malária humana. A duração do contato dos insetos com a superfície interna das habitações tem grande importância para o efeito dos inseticidas de ação residual aí aplicados. As espécies que têm por hábito abandonar as casas logo depois de se alimentarem, ou que ficam muito pouco tempo, subtraem-se mais facilmente à intoxicação pelos inseticidas. O principal vetor da malária no Brasil é o Anopheles darlingi. Cria-se em grandes coleções de água, como represas e lagos. Encontra-se em águas profundas, límpidas, pobres de matéria orgânica. Além de sua domesticidade (endofilia), é notavelmente antropófilo, picando homens de preferência a outros animais.

Modo de Transmissão

A doença se transmite por uma fêmea anofelina infectante. A maioria das espécies se alimenta nas primeiras horas da noite. A malária pode transmitir-se por injeção, transfusão de sangue ou por seringas contaminadas. Pode haver transmissão congênita em casos excepcionais.

Período de Incubação

A média é de 12 dias para o P. falciparum,14 dias para o P. vivax e 30 dias para o P. malariae.

Período de Transmissibilidade

O homem infecta o mosquito enquanto circulem no sangue gametócitos em número suficiente para que o mosquito, ao sugá-lo, possa ingerir gametócitos de ambos os sexos. O mosquito permanece infectante durante toda a sua vida.

Suscetibilidade e Resistência

Todas as pessoas são suscetíveis à infecção. Os adultos de uma coletividade altamente endêmica, onde a exposição aos anofelinos continua por muitos anos, desenvolvem tolerância ou resistência a infecção.

Distribuição

No Brasil, 99,5% dos casos foram registrados na Amazônia Legal. Considere-se que a maioria dos pacientes que compõe os 0,5% restantes adoeceu na Amazônia, mas a identificação foi feita nas demais regiões (casos importados).

Aspectos Clínicos

Em pequeno número de pacientes aparecem sintomas prodrômicos vários dias antes dos paroxismos da malária. O paciente sente incômodo com cefaléia, náuseas, vômitos, astenia, fadiga, anorexia e febre. Tais sintomas são inespecíficos. O ataque agudo de malária caracteriza-se por um conjunto de paroxismos febris que apresentam 4 períodos sucessivos: frio, calor, suor e apirexia. Na maioria dos doentes, a sintomatologia começa repentinamente com o período de frio, que dura de 15-60min. Os sintomas se relacionam com o ↑ brusco de T e se caracterizam pela sensação de frio intenso, calafrio com tremor generalizado e ranger dos dentes. Podem ser acompanhados de cefaléia, náuseas e vômitos. O pulso é débil e rápido; a pele está seca, com rugas. Os lábios ficam cianóticos. Nessa etapa, sobretudo em crianças, podem ocorrer, crises convulsivas. O período de calor dura de 2-6h e se inicia quando termina o calafrio. O paciente começa a sentir-se quente, a face fica hiperêmica, o pulso é forte e a pele seca e quente. A dor de cabeça, que aparece na etapa anterior, ↑ em intensidade e as náuseas e vômitos podem continuar. A respiração é rápida e o paciente tem sede. A T pode alcançar 40° ou mais e não responde aos antitérmicos. Alguns pacientes, podem apresentar delírio. O período de suor dura de 2-4h. A febre ↓ rapidamente e a cefaléia, sede e mal estar cedem. O doente tem a sensação de alívio e de tranqüilidade. Quando o suor termina, o paciente sente-se cansado e débil; livre dos sintomas pode ter um sono tranqüilo. A duração total do paroxismo varia de 6-12h.

Formas Clínicas

Nas formas leves a T não é alta, os sintomas são discretos e a parasitemia é ↓ . Embora possa existir anemia, ela não é muito marcada. A forma moderada é típica de indivíduos não imunes, que apresentam o paroxismo febril nos períodos de frio, calor e suor. A T é alta, com ↑ nas crises, os sintomas gerais são mais intensos, com forte cefaléia. A parasitemia varia de 0,1-0,5% e os valores da Hb, o número de hemácias e o VG indicam anemia moderada. As formas grave e de urgência são observadas nas infecções produzidas por P. falciparum, apresentando-se em indivíduos não imunes, grávidas e crianças. O paroxismo febril não é comum. O paciente mantém uma febre persistente, não muito elevada, e não apresenta calafrios, nem suor. A cefaléia é forte, o vômito freqüente e pode apresentar delírio. Podem estar parasitados até 2% dos eritrócitos e a anemia é intensa, com nítida ↓ da Hb e VG. Se o paciente não recebe terapêutica específica, adequada e oportuna pode evoluir para a forma de urgência. Os sintomas anteriores são mais graves e aparecem as complicações. As manifestações mais freqüentes se relacionam com rins, pulmões, fígado, cérebro e sangue. A febre é variável, mas com freqüência ↑ ; a cefaléia e vômitos são persistentes; a urina se reduz e concentra. Pode-se notar icterícia, principalmente na conjuntiva e taquipnéia. O paciente sente-se confuso e com o raciocínio lento. A parasitemia é ↑ 2% e pode alcançar 30% ou mais. A anemia é muito intensa e pode ocorrer uma ↓ 50% na Hb na semana de evolução.

Diagnóstico Clínico

Quando o exame de sangue não puder ser feito ou quando permanecer (-), apesar da suspeita, devem ser considerados como fatos relacionados com a malária:

  • febre intermitente, especialmente se ocorre, juntamente aos sintomas que acompanham, com regularidade cada 48 ou 72h;

  • anemia hipocrômica, com leucócitos N ou ligeiramente ↓ e o VG pode ↑ no início da febre (fase de calafrios);

  • baço aumentado e doloroso;

  • residência ou procedência de zona endêmica, assim como a Hx pregressa de exposição provável à picada de mosquitos anofelinos; e

  • resposta favorável e rápida aos antimaláricos.

Diagnóstico Diferencial

O Dx diferencial terá que ser feito em certos casos, com febre tifóide, febre amarela, hepatite, calazar, esquistossomose, abscesso amebiano hepático e leptospirose. Em crianças, que podem apresentar quadros clínicos mais variados e menos típicos, há que excluir as outras causas de doenças febris antes de instituir o tratamento. Na fase inicial, sobretudo na criança, a malária confunde-se com outras doenças infecciosas dos tratos respiratórios, urinário e digestivo, de etiologia viral ou bacteriana. No período de estado, com febre já tendendo à intermitência, os principais Dx diferenciais são: ITUs, Tb miliar, salmoneloses septicêmicas, calazar, endocardite e as leucoses, pois todas, a par da febre, apresentam esplenomegalia, algumas delas, anemia e hepatomegalia.

Tratamento

O tratamento da malária tem como objetivo principal eliminar os plasmódios do sangue (ciclo eritrócito), que são os que produzem o ataque clínico, assim como as complicações orgânicas da malária falciparum. Nas infecções por vivax e malariae, é necessário eliminar os plasmódios que se encontram no fígado para evitar as recaídas da doença após a cura clínica. No tratamento radical da infecção por P. vivax, emprega-se cloroquina-base, acrescentando primaquina. Nas infecções por P. malariae, usa-se o mesmo esquema anterior menos a primaquina. Para tratamento dos P. falciparum multirresistentes (áreas "de alto risco"), deve-se usar outro esquema como: sulfato de quinina, associado a doxiciclina, mais primaquina.

Casos graves e complicados de P. falciparum: são casos de emergência que exigem pronto emprego de medicação anti-malária de ação rápida e eficaz. Estão sendo utilizados os derivados de Artemisinina, que se mostra superior às quinolinas antimaláricas, no tratamento tanto da malária sem complicações, como a malária grave e complicada. Sua rapidez de ação, praticamente sem efeitos colaterais, nova estrutura molecular e modo de ação, a colocam entre as mais importantes drogas antimaláricas da atualidade. Com relação às gestantes, considerando a quase completa inocuidade da cloroquina, essa deve ser a droga de 1° escolha para tratamento de todos os tipos de malária. No caso de infecções mistas, deve-se tratar a espécie que apresentar formas assexuadas e que esteja produzindo o ataque primário; no caso de existirem anéis de falciparum e formas de vivax, o tratamento inicial deve ser dirigido ao falciparum.

Recrudescência e Recaídas

No caso de infecções por P. falciparum, não ocorrem recaídas porque, depois da 1° esquizogonia hepática (ciclo exo-eritrocítico), não permanecem plasmódios no fígado. Entretanto, se o tratamento do ataque clínico não é suficiente e completo, podem ficar parasitas na circulação sangüínea que podem produzir recidivas e novos ataques. Também algumas cepas de P. falciparum que são resistentes a medicamentos antimaláricos, quando não eliminadas do sangue produzem novas manifestações clínicas. Nas infecções por P. vivax, os hipnozoítos que ficaram no fígado vão "acordando" periodicamente, depois da primo-infecção e vão produzindo novos ataques clínicos conhecidos como "recaídas".

Diagnóstico Laboratorial

A confirmação do Dx se faz mediante a demonstração dos parasitos da malária em amostras de sangue.

  • Gota Espessa: o Dx laboratorial da malária tem sido tradicionalmente pelo método da gota espessa. Este é um método sensível e um bom microscopista detecta 0,001% de parasitemia.

  • QBC (Quantitativa Butty Coat): método capilar para exames hematológicos. É um método muito sensível e de fácil execução para a triagem da malária em populações endêmicas.

  • Imunodiagnóstico: Naquelas, onde a malária é endêmica ou já foi, eles são úteis para medir o grau de endemicidade da doença; investigar a reintrodução da malária nas zonas com programas de controle e avaliar as atividades antimaláricas. Nas zonas onde a malária não é endêmica, os métodos sorológicos são úteis para selecionar doadores de sangue; elucidar casos indefinidos; avaliar a terapêutica; e detectar indivíduos com formas latentes da doença (principalmente os infectados por P. vivax e P. malariae). Abrangem: imunofluorescência indireta, ELISA, aglutinação, precipitação e radiodiagnóstico.

Vigilância Epidemiológica

Como fruto do desenvolvimento regular das atividades de combate à malária, a transmissão dessa doença foi interrompida no Nordeste, Sudeste, Sul e parte Meridional do Centro-Oeste, onde permaneçam áreas residuais de transmissão. Nessas regiões, deve ser mantida eficiente vigilância epidemiológica para impedir a reintrodução da endemia, através do Dx e tratamento dos casos e eliminação dos focos novos. A vigilância deve ser ativa para aplicar medidas anti-focais no campo, inclusive medidas anti-vetoriais e busca de casos. Todos os casos detectados devem ser investigados e classificados (autóctones, importados, introduzidos, induzidos e recaídas).

Notificação

A malária é uma DNO em todo país, exceto na região amazônica.

Investigação Epidemiológica

Após a chegada de um caso importado, as possibilidades de transmissão da malária depende da presença e densidade dos mosquitos vetores.

Definição de Caso

  • Suspeito: indivíduo que, procedendo de área onde haja transmissão de malária, ou tendo recebido transfusão sangüínea, apresente quadro febril, especialmente se acompanhado por sintomas sugestivos de malária.

  • Confirmado: apresenta confirmação laboratorial, indicando parasitos no sangue. É necessária a identificação da espécie parasitária.

Conduta Frente a um Caso

Na área extra-amazônica, todo caso suspeito ou confirmado de malária deve ser investigado, visando o tratamento e à prevenção de um surto, caso haja presença dos insetos transmissores na área. A investigação consta de:

  • confirmação laboratorial do caso, através da confecção da gota espessa;

  • definição de caso: autóctone ou importado;

  • tratamento específico do caso;

  • pesquisa entomológica, quando indicada;

  • adoção das medidas de controle pertinentes.

Nas regiões extra-amazônicas, todos os casos devem ser tratados radicalmente e investigados. A presença de casos "importados" constitui a situação mais freqüente: indivíduos adoecem na Amazônia e são detectados em diferentes locais do país. Muitas vezes esses casos dão origem aos casos "introduzidos", uma 1° geração de doentes que resulta da transmissão por mosquitos infectados pelos casos importados. Quando a investigação indica a presença de casos "autóctones", significa que se encontra em evolução um foco de malária, o que obriga a tomada de providências, com caráter de urgência, para a eliminação do foco. O resultado da investigação pode levar à conclusão de que se trata de uma "recaída" - habitualmente um paciente com vivax, com Hx anterior de malária que não esteve mais em áreas de transmissão após o tratamento da infecção natural.

Conduta Frente a um Surto

Na Amazônia, os surtos são freqüentes em áreas de "alto risco", como: garimpos, assentamentos e áreas com extração madeireira. As medidas aplicadas constituem: tratamento e controle dos vetores. Nas zonas de "médio risco", ainda na Amazônia Legal, os surtos correspondem à eclosão de focos novos de malária, estando indicado o uso de medidas anti-focais para sua eliminação. Fora da Amazônia, é preciso determinar a natureza e extensão do surto que equivale a um foco novo de malária: devem ser intensificadas as medidas de luta contra os insetos e formas larvárias de vetores que podem incluir a eliminação de criadouros.

Medidas de Controle

A estratégia mundial de controle da malária, tem 3 elementos fundamentais:

  • Dx imediato e tratamento oportuno dos casos;

  • planejamento e aplicação de medidas anti-vetoriais seletivas;

  • detecção pronta de epidemias para contê-las;

No combate aos vetores, o programa de malária utiliza produtos químicos, como: organofosforados (Malathion e Fenithion) e piretróides. Os fosforados são utilizados em nebulizações especiais e os restantes em borrifações intra-domiciliares. Atividades de saneamento poderão ser empregadas caso haja justificativa, visando a eliminação de criadouros de anofelinos (drenagem, retificação de cursos d’água, aterros).

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