CLÁUDIA COLLUCCI da Folha de S.Paulo

11/05/2008 - 08h54

Gravidez improvável tem a ver com emoção, dizem médicos

Tidas como "inférteis" e após anos de tratamentos de fertilização para engravidar, muitas mulheres têm conseguido gerar filhos naturalmente, algumas ainda enquanto amamentam seus bebês de proveta.

Não há dados no Brasil sobre esse fenômeno, mas um estudo recente acompanhou 5.962 casais que estavam na lista de espera para fazer FIV (fertilização in vitro) na Holanda e constatou que 9% deles engravidaram espontaneamente num período de 12 meses.

Outros trabalhos científicos apontam que, para mulheres jovens, com pouco tempo de tentativas de gravidez e com a chamada "esterilidade sem causa aparente", as chances de gestação espontânea chegam a 25% em um ano --quase o mesmo percentual de resultados da FIV, estimados em 30%.

Na falta de pistas na chamada medicina baseada em evidências, especialistas em reprodução lançam mão das mais variadas análises para explicar por que mulheres "condenadas" a não ter filhos espontaneamente o fazem depois que desistem dos tratamentos ou após gerarem bebês de proveta ou ainda quando partem para a adoção de uma criança.

"Quem dá a vida é Deus e quem tira é Deus também. Tenho tido casos [de casais inférteis] tão esdrúxulos que engravidam e casos tão claros de que medicina vai resolver e não resolve, que cada vez mais acredito nisso", diz o ginecologista Artur Dzik, diretor do Serviço de Esterilidade Conjugal do Hospital Pérola Byington.

Outra explicação, segundo ele, seria a relação estreita existente entre as emoções e os hormônios. "Quem manda na gente é a nossa cabeça. O sistema emocional está do lado do sistema hormonal, recebe as descargas dos hormônios."

A endocrinologista e nutróloga Vania Assaly diz que o processo de tratamento da infertilidade pode gerar situações de estresse, exaustão e desgaste, que desfavorecem uma gestação. Isso ocorreria por interferências no circuito "psico-neuro-imuno-endócrino". "Muitas coisas que não explicamos devem estar por aí, nesse eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, que circula informações para o sistema imunológico."

Segundo ela, situações de bem-estar, harmonia e calma são referência de um bom território para procriar. "Por outro lado, a presença de um terreno arenoso, com medo, ansiedade e sobrecargas pode trazer dificuldades para essa mulher tanto na fecundação como na nidação [fixação do embrião no útero], à medida que o corpo reflete essa desarmonia no sistema imune e hormonal."

Tempo passar

Para o urologista Edson Borges, da clínica de reprodução Fertility, raramente as chances de um casal engravidar são "zero". "Exceto em casos de grande falência testicular ou de grande falência dos ovários. Mesmo assim, essas situações podem ser transitórias e, em algum ciclo especial, o casal pode engravidar", diz ele.

Borges afirma que nos casos onde não há uma causa específica para a dificuldade de gravidez, a gestação natural pode ocorrer a qualquer momento. "Deixamos claro que os tratamentos vão ajudar para que a gestação ocorra de forma mais rápida e é sempre melhor isso do que deixar o casal aguardando o tempo passar."

De acordo com o médico, para mulheres acima de 30 anos, cada ano de espera diminui em 11% suas chances de ser mãe. "A sensação de "ter tentado" [a gravidez por meio de tratamentos] algumas vezes é tão importante quanto o próprio resultado", acredita ele.

Emoções

Na avaliação da psicóloga do Hospital das Clínicas de São Paulo Luciana Leis, muitas mulheres engravidam naturalmente após tratamentos de reprodução assistida ou depois de uma adoção porque se sentem "autorizadas" para a gravidez.

"As dificuldades, os tratamentos frustrados acabam escrevendo um "não", uma incapacidade de gerar no inconsciente da mulher. Depois que conseguem ser mães, ou por FIV ou pela adoção, é como se as portas para a gravidez se abrissem", explica.

No caso das mulheres que engravidam após desistirem dos tratamentos, ela defende que isso ocorre em razão de um "relaxamento das tensões". "Não é uma receita de bolo. Não é fácil falar em relaxamento nessas situações. Mas é preciso mudar o foco, olhar para outras áreas da vida que, às vezes, ficam abandonadas nessa busca por um filho."

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