Diário do Timor


COOPERAÇÃO INTERNACIONAL BRASIL/TIMOR-LESTE
Programa de Qualificação de Docente e Ensino de Língua Portuguesa no Timor-Leste

COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR

RELATÓRIO DE BOLSISTA DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

ERIVELTO RODRIGUES TEIXEIRA

Díli, Timor-Leste

2008

PARTE 1

ATIVIDADES COMO BOLSISTA DO PROCAPES

1.1 Curso de Capacitação Intensiva de Professores Timorenses no Ensino de Biologia em Língua Portuguesa no distrito de Ainaro, região III do Timor-Leste

O trabalho desenvolvido buscou a preparação plena do professor de Biologia do Timor-Leste, no âmbito de um novo paradigma educacional centrado na capacitação em Língua Portuguesa, desenvolvendo técnicas de ensino adequadas à realidade do professor timorense, bem como, reconhecendo conteúdos que dificultavam no processo ensino-aprendizagem, além de orientar na utilização das sebentas e guias de Biologia, produzidos pela Cooperação Brasileira.

1.1.1 O público alvo e as divisões regionais dos professores cooperantes

O público alvo do curso de capacitação em Biologia esteve dividido em quatro regiões, com sedes nos distritos de Dili, na região I, Baucau, na região II, Ainaro, na região III e Maliana na região IV.

Fui designado pelo Coordenador da Capes, o Professor Doutor Fernando Spagnolo, a compor o grupo da região III, Ainaro. Na equipe também faziam parte um professor de física, um de matemática, uma professora de química e uma professora para língua portuguesa. Viajamos para o distrito de Ainaro no dia 20 de julho de 2008, para atender professores oriundos dos distritos de Manufahi, Aileu e Ainaro e seus respectivos sub-distritos. Em Ainaro, trabalhei com um total de 16 professores timorenses, sendo 07 professores do curso secundário e 09 do curso pré-secundário.

As aulas tiveram início no dia 21 de julho, uma segunda-feira, e trabalhamos de segunda a sexta-feira, com oito horas diárias de curso. Terminando no dia 19 de setembro de 2008.

1.1.2 O planejamento do curso de capacitação

O curso de capacitação começou com uma proposta de trabalho totalmente definida para uma realidade baseada no que se conhecia sobre os professores timorenses da capital. No entanto, a realidade encontrada nas outras regiões, se mostrou bastante diferente, principalmente no que discerne sobre o nível de entendimento da língua portuguesa, seja ela escrita, falada ou lida. Isso exigiu o desenvolvimento de uma nova proposta baseada exclusivamente na realidade de cada local. Portanto, a idéia inicial da equipe de biologia de desenvolver um trabalho padronizado nacionalmente se tornara inviável. A nova proposta partiu de atividades escritas e dinâmicas que objetivam a aproximação do professor timorense com o professor brasileiro e com isso se buscar uma interação de modo a estimular o professor timorense a expor suas idéias.

A caracterização do público alvo representava fator determinante no desenvolvimento de um trabalho consistente. Por isso buscou-se identificar pontos positivos e negativos, para com isso montar uma proposta de trabalho. Entre as necessidades do público alvo detectadas, as mais comuns foram: a falta de recursos didáticos, que fazia com que muitas das técnicas ensinadas pelos professores de biologia do Brasil fossem aprovadas, mas argumentadas pelos professores timorenses de que em suas escolas não teriam acesso a materiais de apoio como pincéis, giz de cera ou mesmo papel ofício. A infra-estrutura escolar básica e a qualificação profissional insuficiente dos professores alvo do curso de biologia na área de atuação demonstraram-se um grave empecilho na elaboração de um bom trabalho, aonde o nível de formação ia de apenas curso secundário até licenciaturas incompletas ou diplomas indonésios, e em outras áreas como agricultura, saúde e física.

A definição de currículo a ser adotado pelo Governo do Timor-Leste foi uma cobrança constante por parte dos professores timorenses, que muitas vezes alegavam estar fazendo cursos que em muito pouco tempo perderiam a importância por estarem desatualizados, e essa desatualização em se tratando de Biologia representa um fator de grande relevância devido aos constantes avanços científicos.

Entre os pontos positivos destaca-se a receptividade dos professores timorenses com os professores brasileiros, a disposição em aprender novas técnicas e metodologias de ensino, além do apoio local aos professores brasileiros, principalmente na atuação da responsável pela educação no distrito de Ainaro, a Senhora Filomena Corte-Real.

1.1.3 A avaliação diagnóstica

Em todas as quatro regiões distritais do Timor-Leste forami feitas avaliações padronizadas pela coordenação brasileira durante o curso, para identificar o perfil do público alvo da capacitação em Biologia e das demais disciplinas também, e entre os resultados do diagnóstico de Ainaro, o principal dado refere-se à proficiência da língua portuguesa insuficiente, o que nos leva a questionar como um professor timorense vai conseguir dar aulas em português se este não consegue se comunicar no idioma, isso aliado ao desconhecimento de outras técnicas de ensino que foge do ensino tradicional, e também a dificuldade de domínio de conteúdos específicos da biologia, devido à qualificação insuficiente dos professores timorenses da região de Ainaro por não possuírem nível superior na área de biologia.

No contexto do enfoque das facilidades e dificuldades encontradas no processo do curso de capacitação em Biologia são muitos os pontos positivos que merecem destaque. O mais importante é a boa receptividade dos professores timorenses aos professores brasileiros, onde ficou evidente a disposição do professor timorense em aprender novas técnicas e metodologias de ensino de Biologia.

No que discerne sobre as dificuldades, a falta de sebentas desde o início do curso representou um grande comprometimento na capacitação na região de Ainaro, afinal o objetivo maior era ensinar o professor timorense a dar aulas em língua portuguesa utilizando as sebentas recém elaboradas pela cooperação brasileira. Mas, a comunicação em língua portuguesa deficiente principalmente no entendimento do conteúdo também exigiu muitos re-planejamentos ao longo do percurso.

1.1.4 As técnicas de ensino transmitidas aos professores timorenses

As técnicas de ensino a serem usadas foram apresentadas desde o início do curso aos professores timorenses na região de Ainaro, assim o professor timorense sabia exatamente o que esperar do curso. Foi elaborado um cartaz com as técnicas de ensino e ao lado de cada uma delas um quadro que seria marcado à medida que o objetivo era alcançado.

A apresentação de outras técnicas de ensino ao professor timorense partiu de questionamentos sobre como eram dadas as aulas nas escolas timorenses, onde se constatou um ensino bastante tradicional. As técnicas de ensino utilizadas com seus devidos objetivos foram:

a. Leitura Marcada

Objetivos: Desenvolver a leitura interpretativa e reconhecer o som de palavras em português.

A técnica denominada Leitura marcada teve um cartaz explicativo com seus objetivos e metodologias. Consistia de uma leitura feita pelos alunos, um aluno para cada parágrafo, o professor deveria indagar o aluno sobre o entendimento do parágrafo para em seguida, o professor explicar brevemente o parágrafo e assim continuar a leitura com outro aluno escolhido pelo aluno que terminou de ler. O resultado foi positivo na análise dos professores timorenses, mas, esbarrou num argumento bem convincente que dificultaria sua aplicação, a falta de livros para os alunos. Igualmente, um professor timorense em Ainaro, levantou a questão de trabalhar com esquema com tópicos lidos pelos alunos diretamente do quadro, porém, um esquema mais ampliado do que seria utilizado na próxima técnica, a aula explicativa com esquema.

b. Aula Explicativa com Esquema

Objetivos: Desenvolver a capacidade de síntese do professor e construir conhecimentos a partir da interligação de conceitos.

Nessa técnica de ensino o professor timorense acompanhava a montagem de um esquema a partir de um exemplo fornecido pelo professor brasileiro, primeiro através de um cartaz explicativo da técnica com seus devidos objetivos e metodologias e, depois assistia uma aula do professor brasileiro trabalhando a técnica e, em seguida ele mesmo daria sua própria aula. À medida que surgiam situações que colocavam em risco a técnica, a aula era paralisada e o professor brasileiro conversava com o professor timorense em particular para depois reiniciar a aula. Ao final, a análise da técnica foi considerada bastante viável de ser aplicada no dia a dia das aulas dos professores timorenses.

c. Aula Dialogada

Objetivos: Desenvolver a capacidade de raciocínio lógico e sistematizar conhecimentos.

Igualmente a técnica anterior esta também teve à disposição um cartaz explicativo. O professor deveria estudar o conteúdo previamente, e à medida que explicava usava o quadro para registrar palavras pertinentes ao tema explicado. Mas, sem utilizar nenhuma fonte de consulta enquanto dava sua aula. Na análise dos professores timorenses, eles demonstraram estar receosos em trabalhar dessa forma, mas, gostaram de passar segurança e domínio de assunto para o aluno. A técnica foi aprovada pelos professores timorenses da região III.

d. Aula Expositiva

Objetivos: Interligar teoria e prática e construir conhecimento.

Nessa técnica o professor deveria colocar palavras no quadro e explicar seu significado em seguida, contextualizar o tema à medida que questionava os alunos através de diálogos diretos. O professor não poderia usar nenhuma fonte de consulta escrita enquanto aplicava suas aulas, para demonstrar domínio de conteúdo, e assim fortalecer seu vínculo com o aluno.

e. Visita de Campo

Objetivos: Reconhecer conceitos teóricos na prática e buscar a interação com o aluno na redescoberta do conhecimento.

As aulas de visita de campo serviram para coletar material para a técnica: Aula expositiva. O professor deveria explorar os recursos e junto com o aluno construir o conhecimento, partindo de teorias até as práticas. A aula exigia um conhecimento mais aprofundado sobre conceitos biológicos, por isso alguns professores, por não terem a devida qualificação tiveram alguma dificuldade em executar a técnica.

f. Aula Prática

Objetivos: Inter-relacionar teoria e prática e reconhecer conceitos básicos.

A primeira prática consistia em pegar duas garrafas plásticas transparentes, terra, uma planta qualquer e um inseto e lacrar tudo com fita adesiva transparente, formando um ecossistema artificial. Ao término o aluno deveria expor seu trabalho e o professor deveria questioná-lo quanto à transpiração vegetal. Sendo que o aluno deveria justificar suas devidas afirmações.

Para a fermentação fúngica usou-se uma garrafa plástica, água com açúcar e um balão de gás. Após o inicio da reação o aluno seria questionado sobre os fenômenos que estavam ocorrendo.

O pulmão artificial foi feito com um copo plástico, um tubo de caneta vazio e dois balões de gás. O aluno deveria ser questionado sobre os processos de inspiração e expiração e identificar os órgãos do sistema respiratório comparados ao experimento.

g. Seminários, Jogos e Dinâmicas de Grupos

Objetivos: Introduzir novos mecanismos de avaliação contínua e induzir os alunos a participar das aulas.

A primeira dinâmica chamava-se tira o chapéu, o conteúdo trabalhado com essa técnica foi sobre o primeiro capitulo da sebenta do 1º ano do curso secundário e do 1º ano do curso pré-secundário. Cada um dos alunos deveria redigir uma pergunta com a devida resposta, dentro do conteúdo trabalhado previamente, e colocá-la no chapéu. Lembrando que a dinâmica incluía a posse de uma bala do tipo pirulito por cada um dos alunos. Todos os alunos foram desafiados um a um pelos colegas, quem acertava a pergunta ganhava a bala do desafiador, errando a resposta, deveria entregar sua bala ao seu desafiante. Ao término da atividade a técnica era colocada em discussão pelo professor brasileiro e os professores timorenses analisavam as possibilidades de implantação em suas aulas.

Alguns conteúdos trabalhados não faziam parte das sebentas, mas seguindo orientação da proposta inicial do curso de tirar dúvidas e de auxiliar o professor timorense, segundo seus interesses sobre conteúdos programáticos, trabalhamos material curricular de segundo e terceiro anos do curso secundário, principalmente bioquímica. Um desses conteúdos solicitados foi sobre aminoácidos. Nesse conteúdo buscou-se trabalhar uma proposta de diferenciação baseada não em decorar os nomes, mas entender o código genético que estava envolvido na formação dos mesmos. Esse conteúdo foi trabalhado através de um bingo, denominado bingo dos aminoácidos, onde cada aluno elaborou uma cartela de bingo contendo diferentes códons. Em seguida, o professor brasileiro, retirava de uma sacola plástica nomes de aminoácidos e o professor timorense deveria olhar para um cartaz do código genético e verificar se o aminoácido informado fazia parte de sua cartela. A proposta foi bem aceita, mas, alguns professores se mostraram pouco entusiasmados devido à lentidão demonstrada por alguns colegas em decifrar o código genético e acreditaram que seus alunos poderiam demonstrar a mesma dificuldade, mas, outros professores timorenses acreditam que podem desenvolver sim esta atividade em suas salas de aula.

Seminários foram usados para tirar dúvidas sobre os mais diversos temas da biologia, mas eram centrados em como o professor deveria avaliar o desempenho do aluno de modo a não tolir a criatividade, e sim incentivar a exposição de idéias.

h. Feira de Ciências

Objetivos: Difundir conhecimentos científicos e aproximar a comunidade da escola.

A idéia da feira de ciências foi expor todos os materiais produzidos para os visitantes. Cada dupla de professores recebeu um tema e deveria buscar meios para expor o tema, para isso usavam cartazes, folders e modelos aprendidos ao longo do curso.

i. Recursos audiovisuais – TV Escola e Documentários

Objetivos: Utilizar vídeos, imagens e software para fixar conhecimentos específicos e induzir o aluno à reflexão através da visualização de ações do cotidiano.

Com o uso de laptops, foram apresentados aos professores timorenses documentários sobre os mais diversos temas da biologia com o intuito de demonstrar ao professor como ele pode explorar a exibição de filmes e softwares na fixação de conhecimentos pelos alunos, incluindo filmes produzidos no Brasil por professores cooperados, de forma a promover, ao menos superficialmente, um intercâmbio cultural com os alunos.

j. Elaboração de atividades diversificadas: Gibi, Palavra-Cruzada, Álbuns e Painéis

Objetivos: Diversificar as atividades diárias dos alunos buscando a motivação na sua realização e incentivar a criatividade na elaboração de trabalhos para casa.

Baseada no conteúdo das sebentas partiu-se para essa nova técnica. Nesse ponto, foi apresentada ao professor timorense a técnica de elaboração de atividades diferenciadas como: palavra-cruzada, uma palavra chave era colocada e para cada letra desta palavra desenvolvia-se uma pergunta cuja resposta deveria ser somente uma palavra e ter a letra correspondente a palavra chave. Outra atividade chamava-se código secreto, o professor elaborava a pergunta, cuja resposta era somente uma palavra e esta palavra era apresentada ao aluno com as sílabas invertidas, o aluno deveria decifrar esse código. Em outra proposta do mesmo nível a resposta não era apresentada, mas, o aluno sabia a quantidade de letras que compunham a mesma através de quadros ou traços. A criação do gibi exigiu mais criatividade, já o painel de seres vivos foi feito a partir de visitas de campo com recolhimento de sementes, folhas e flores, o álbum de folhas prensadas foi feito a partir da desidratação de folhas simples e compostas.

k. Produção e uso de cartazes

Objetivos: Direcionar enfoque em conteúdos específicos e visualizar temas relevantes da biologia.

Esta técnica foi centrada em ensinar o professor timorense a utilizar materiais didáticos como cartazes, sejam estes de origem impressas ou confeccionados pelo próprio professor. Ao final, com a discussão dos resultados da técnica evidenciou-se que apesar de terem considerado a utilização de cartazes positiva e de grande valia no processo ensino-aprendizagem, o acesso a matérias-primas seria o fator relevante e decisivo, pois, nem todos têm a sua disposição cartolinas, pincéis ou giz de cera, que foram os materiais utilizados na confecção dos cartazes.

1.2 Bacharelato em Biologia

À medida que vivo no Timor-Leste, descubro que nem sempre as coisas aqui devem ser escritas, ou devem ser escritas na areia da praia para as ondas do mar apagar. O início do curso de bacharelato em biologia se transformou numa verdadeira novela. Deveria ter início no dia 13 de outubro de 2008, depois foi transferido para a semana seguinte. Por fim do dia 20, uma segunda-feira foi transferido para a quarta-feira e depois para o dia 27. Somos professores a procura de alunos. O inicio do curso depende do deslocamento dos professores timorenses, de seus distritos de origem para Díli. Mas, o orçamento do governo timorense para liberação de verbas para o Instituo de Formação Profissional e Contínua, onde iria ocorrer o curso, ainda não havia sido aprovado.

O grupo da biologia ao qual faço parte tem sido bem democrático na divisão dos trabalhos, para evitar que alguém fique sobrecarregado ou sem tanto trabalho para fazer. Isso sempre foi consenso entre todos, a boa relação profissional que temos supera qualquer divergência que possa surgir. Somos um grupo com pessoas bem flexíveis, com pessoas dos quatro cantos do Brasil. Eu como o representante da Amazônia, o Anderson do Centro-oeste, a Marina e o João Cleto de São Paulo, o Luis do Rio de Janeiro, o Leonardo e mais recentemente, a Bianca, que inicialmente pertencia ao grupo da química e foi incorporada à biologia por ter formação em biologia, os dois são oriundos do sul do Brasil, mais precisamente do Paraná. Diferentes sotaques, mas falando a mesma língua.

As aulas do bacharelato de emergência começaram no dia 27 de outubro de 2008 com duas turmas de professores timorenses em sua maioria, cerca de 90%, professores primários. Inicialmente eu deveria ministrar aulas de Microbiologia, minha especialidade, e alguns conteúdos de ecologia. Depois da desistência do colega Leonardo que pediu para voltar ao Brasil, unimos as turmas e fiquei apenas com microbiologia. Mais adiante a professora Bianca sofreu m acidente enquanto praticava esportes e foi afastada do bacharelato a pedidos médicos, agora todos têm mais aulas a ministrar. No dia 13 de dezembro de 2008 finalmente as aulas são encerradas.

1.3 Produção da Sebenta de Biologia

Esta parte do relatório é uma das que mais me dá orgulho. Estou escrevendo um livro que será utilizado por um país inteiro, o Timor-Leste. Isso provavelmente nunca iria acontecer se não tivesse tido esta oportunidade, por isso sou sempre grato por esta chance, ao qual não pretendo desperdiçar. E se possível abrir caminhos para outras oportunidades.

Estou escrevendo sobre o sistema locomotor, para a sebenta do segundo ano secundário, ainda não se confirmou se deveremos fazer também a sebenta do terceiro secundário, mas se houver a confirmação, minha parte será sobre bioquímica. Estou buscando uma linguagem simples e de fácil entendimento, afinal os professores timorenses tem grande dificuldade com a língua portuguesa, e isso foi constatado no curso de capacitação, onde palavras que se imaginavam serem simples e de fácil entendimento, se demonstraram desconhecidas para os timorenses.

Fizemos alguns acordos entre nosso grupo, o primeiro que todos devem ler os capítulos dos colegas e apontar possíveis divergências com seu conteúdo e assim chegarmos a um consenso, uma linguagem única, padronizada. Entreguei meu primeiro capitulo, sobre o sistema muscular, para apreciação dos colegas no dia 19 de novembro devendo recebê-lo de volta corrigido no dia 1 de dezembro. Após essa data o material foi encaminhado ao ELPI no dia 9 de dezembro de 2008, para as correções da língua portuguesa que serão feitas pela professora Isabela.

PARTE 2

ATIVIDADES COM TRABALHOS INDIVIDUAIS E ESPECÍFICOS

2.1 Curso de graduação na formação de professores das séries iniciais: Universidade Nacional Timor-Lorosa’e

2.1.1 Disciplinas trabalhadas: Biologia II e Metodologia do ensino de ciências

Desde que cheguei ao Timor-Leste, um de meus objetivos sempre foi ter a oportunidade de trabalhar como docente na Universidade Nacional Timor Lorosa’e - UNTL, por isso candidatei-me a uma vaga para áreas afins da biologia, assim, havendo uma chance eu estaria apto conforme a necessidade da UNTL.

Não demorou muito tempo e fui convidado a ocupar a vaga de Metodologia do Ensino de Ciências no curso de graduação denominado Formação de professores para series iniciais, o que no Brasil se conhece como normal superior. Na semana seguinte recebi mais um convite, na mesma turma, para ocupar a carga de biologia II. Essa experiência tem se revelado uma das mais gratificantes profissionalmente. Gosto de ser professor e não tenho medo de enfrentar desafios, escolhi essa profissão para buscar uma realização profissional e finalmente estou conseguindo isso.

Meu trabalho na UNTL consiste de uma aula semanal de biologia II, das 13h as 17h, todas as quartas-feiras, discentes do 5º semestre e do 7º semestre.. E também, metodologia do ensino de ciências, todas as segundas, das 07h30 as 9h30 da manhã, esta somente com alunos do 5º semestre. É uma turma que estuda somente em língua portuguesa, portanto a barreira do idioma que existiu no curso de capacitação não se torna tão evidente ou problemática.

PARTE 3

AUTO-AVALIAÇÃO

Sou brasileiro, oriundo de uma das regiões mais visadas do país por todo o mundo: a Amazônia. Nascido e criado em Barcelos, município do norte do Estado do Amazonas, fronteira com a Venezuela, residindo a quase dois anos na capital estadual, Manaus. Até o início do ano de 2008, não imaginava que iria estar tão longe de casa. Foi quando vi um edital de trabalho internacional na página da agência de fomento do Ministério da Educação do Brasil na internet, a Capes, contratando sete professores de biologia do país inteiro para participar do Programa de Cooperação Internacional Brasileiro em um pais que pouco ou quase nada conhecia, o Timor-Leste.

Quando informei minha família que sairia do Brasil e iria para o Timor-Leste, meu pai e minha mãe, principalmente, ficaram surpresos e receosos, mas quando expliquei melhor o que ia fazer, recebi apoio de todos.

A aprovação na seleção nacional foi recebida com surpresa por muitos amigos meus, e também pelos meus ex-professores da Universidade Federal do Amazonas, pois se tratava de uma seleção nacional e normalmente, quando isso ocorre, as vagas acabam sendo preenchidas por profissionais de grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro. Então virei motivo de orgulho para todo um estado, pois da minha região somente eu fui selecionado. Seria minha primeira viagem ao exterior.

Para chegar ao Timor-Leste, passei por uma maratona aérea literalmente, nunca havia viajado tanto de avião, foi um total de cinco aviões: o primeiro, terça-feira, dia 8 de julho, às 03h45min da madrugada, um vôo doméstico de Manaus, onde residia, até São Paulo, onde deveria chegar às 08h30min. Devido às más condições do tempo em São Paulo, o vôo foi transferido para a cidade de Campinas, de onde voltamos para São Paulo às 11h30min; depois outro avião de São Paulo para Santiago, no Chile, saindo às 16h30min daquele mesmo dia; trocamos de aeronave para sair novamente algumas horas depois para Auckland, na Nova Zelândia, e em seguida, Sydney, na Austrália, um dos lugares mais bonitos que conheci. Passamos um dia em Sydney, intrigado com o fato de um dia inteiro de minha vida que havia desaparecido devido ao fuso horário. Procuramos recuperar este dia perdido conhecendo pontos turísticos de Sydney, guiado pelo nosso coordenador geral da Capes, Fernando Spagnolo. Conheci lugares como o Ópera House e o Aquarium e naquela noite do dia 10 de julho, viajamos para Darwin, uma área de clima mais quente da Austrália, chegamos tarde da noite e por isso resolvemos dormir no aeroporto mesmo, pois o vôo para Díli sairia logo cedo.

Chegamos a Timor-Leste naquela manhã do dia 11 de julho de 2008, o nosso presidente Lula estava em visita oficial ao País, e, em um encontro com brasileiros residentes no Timor-Leste, apresentou-nos a todos. Eu, particularmente nunca pensei que iria um dia ver o presidente do Brasil tão perto e falando sobre um trabalho que eu iria executar. Senti-me bastante orgulhoso de estar ali naquele momento. Passei alguns dias conhecendo e me ambientando com a capital de Timor-Leste: Díli. No dia 20 de julho, fui deslocado para um dos lugares mais surpreendentes que poderia conhecer nesse país: o distrito de Ainaro. Chegara finalmente o momento de trabalhar.

A viagem para Ainaro, levando a equipe formada por quatro dos cinco profissionais brasileiros da educação, saiu às 11h da manhã do dia 20 de julho de 2008, um domingo, o sotaque da equipe era nordestino, com exceção de minha pessoa, cuja forma de falar os fazia pensar que eu era carioca, mas nunca omiti minhas origens, pois sempre tive orgulho de minhas raízes.

Tínhamos a missão de capacitar professores timorenses em quatro áreas de conhecimento especifico: Biologia, Química, Física e Matemática. O ultimo professor da equipe chegaria uma semana depois.

Enfim, as montanhas se apresentaram a nós, cobertas por brumas, com destaque para a maior de todas as montanhas, o monte Tatamelau ou Ramelau, o maior pico do antigo império português. A paisagem era diferente de tudo que havia visto na minha região, no Brasil. Nuvens cobriam a paisagem à medida que o carro subia a estrada de curvas, o frio começava a nos incomodar, a mim principalmente que vinha de uma região de clima tropical e úmido. A montanha malirin, fria em língua Tétun, fazia o ar ficar cada vez mais rarefeito devido à sua altitude, mais de dois mil metros acima do nível do mar. Finalmente, após quatro ou cinco horas, não lembro ao certo, chegamos a Ainaro.

A experiência profissional em Ainaro se revelou uma das coisas mais gratificantes de toda a minha vida, como professor. Conheci pessoas com crenças veladas e muitas vezes etnocêntricas, que pareciam não combinar com o pouco que conhecia dos professores timorenses que eu estava a ensinar a dar aulas de biologia em português. Um mundo de presença animista e forte influência católica. Parecia reviver décadas passadas, como uma viagem no túnel do tempo. Não posso negar que isso me fascinou bastante.

A minha vida na montanha malirin me fez repensar sobre muitas de minhas crenças, hábitos e atitudes. A convivência com pessoas que nunca tinha visto antes, de cidades distantes da minha, com culturas e hábitos diferentes dos meus, me tornou mais humano e mais forte do que poderia imaginar.

Voltei para a capital do Timor-Leste, Díli, no dia 19 de setembro de 2008, dois meses depois, com o término do curso de capacitação, era um novo homem, menos etnocêntrico, menos orgulhoso, mais humilde e mais consciente e flexível de meus atos, no que discerne sobre ação e reação.

A Díli que havia conhecido quando cheguei no Timor-Leste não era de uma cidade de rotina, de dia a dia, eu era um turista há dois meses atrás, não enxergava as coisas negativas, na verdade só tinha olhos para o mar, o belo oceano índico. Era a primeira vez na minha vida que iria morar em uma cidade com mar. Estava encantado com isso. Mas nem tudo eram flores na capital timorense. Os preços para nós, os malai, gringo em língua tétun, eram diferenciados, muito mais caros que para a população local. Pequenos quartos de hotéis com valores de apartamentos de alto padrão na minha região no Brasil, 500, 600, 700 dólares mensais. Encontrar moradia decente e com um valor acessível havia se tornado um desafio para o próprio bolso.

Em Dili, no início, tive muitas dificuldades para encontrar um local para morar, foi então que conheci Anderson Florentino, com a mesma formação que eu, e ele também oriundo de uma cidade do interior do Brasil, no caso Cláudia, no Mato Grosso. Começamos a dividir o aluguel no final daquele mês de setembro, pagando 320 dólares por mês, dividido entre dois, não ficava tão pesado para o orçamento, foi quando comprei uma moto Honda 100, para conseguir me deslocar na cidade de Díli, uma vez que a cidade não possui serviços de taxi à noite. Não se tratava de um luxo, mas de uma necessidade.

Morávamos na estância de quartos do Senhor Pedro, um chinês que se dizia português, criado na Austrália, durante a revolução. O lugar recebeu o apelido de vila Brasil, devido à grande quantidade de brasileiros residentes ali. Exatos um mês depois, tive minha moto roubada de dentro do estacionamento da vila Brasil. Isso me entristeceu bastante, afinal estava aqui para ajudar este país e fiquei remoendo o porquê de seus habitantes fazerem isso comigo, o tempo passou e procurei não mais pensar no assunto. Não confiamos mais na segurança do local e resolvemos mudar para uma outra estância de quartos, o jacinto. Desta vez tivemos mais um companheiro de moradia, César Cavalcante Filho, um cearense nascido e criado em uma grande cidade brasileira, Fortaleza, mas com hábitos típicos de pessoas do interior. Mudamos-nos para o jacinto no final daquele mês de outubro.

A incerteza do trabalho rondava a todos naqueles dias de outubro de 2008, havia muitas reuniões e não sabíamos exatamente qual seria nosso futuro profissional. Nesta época começou-se a especular que nosso coordenador, Fernando Spagnolo, voltaria ao Brasil deixando a missão do Timor-Leste. Fato infelizmente consumado no final do mês de outubro, deixando o então coordenador interino do procapes, Jailson, como coordenador interino geral da capes, em meio a protestos e conflitos entre Jailson e outros colegas que não o aceitavam por este não ter qualificação suficiente para o cargo.

Em meados de outubro, confirmou-se nosso destino profissional. Faríamos inicialmente dois livros, ou sebentas como chamam os mais antigos na missão, depois resolveram que seria apenas um livro, o do segundo ano secundário. Também trabalharíamos no bacharelado ou como se chama por aqui, bacaharelato de emergência, para formação de professores. Fiquei responsável pelas disciplinas: microbiologia, minha área de formação e ecologia, dividindo esta última com os colegas João Cleto e Luis Henrique.

Nessa mesma época, a professora doutora Rosimeire, companheira de viagem ao Timor-Leste, estávamos no mesmo grupo quando viemos do Brasil, me convidou para ministrar uma disciplina na Universidade Nacional Timor Lorosa’e. No início tinha apenas a disciplina metodologia do ensino de ciências, e depois recebi também a disciplina Biologia II, a convite de uma outra professora veterana do grupo, a paulista Marina Reis. As duas disciplinas, eu ensinava para a mesma turma, um curso de graduação para formação de professores para séries iniciais, o que no Brasil se conhece como normal superior. Era um primeiro sonho realizado, ser professor de uma universidade, e mais, de uma universidade no exterior.

Começava também a acontecer outra grande realização profissional, estava escrevendo meu primeiro livro. Ou parte de um livro, enfim, meu nome estaria na capa. Couberam a mim na divisão de conteúdo, os capítulos referentes ao sistema locomotor, ou seja, o sistema muscular e o sistema esquelético, segundo o currículo adotado, proveniente da Indonésia.

Neste momento decidi não poupar esforços para realizar um bom trabalho. Havia trabalhado em Ainaro, durante a capacitação, com livros feitos por alguns dos colegas que ainda faziam parte da missão, eram livros que tinham muitos erros, que às vezes causavam mal estar entre alguns colegas. Os professores mais antigos da missão, diziam que era a primeira vez que o trabalho deles estava sendo testado.

Então, a linguagem adotada no livro seria primordial para o sucesso ou fracasso da obra que estava sendo escrita. Logo a coordenação do procapes resolveu criar um conselho editorial. Do grupo da biologia foi escolhido um representante, o carioca Luis Henrique, um dos autores da sebenta de biologia do primeiro ano secundário.

Nessa mesma época foram escolhidos outros membros para outras comissões, um de cada área. Fui escolhido como o representante da biologia na equipe responsável pela elaboração de um relatório sobre a capacitação de professores em língua portuguesa, aquele ao qual fui designado a ir para as montanhas, em Ainaro, logo que havia chegado nesse país. Cada disciplina deveria fazer um relatório. Depois os relatórios seriam unidos formando um documento que seria entregue ao Ministério da Educação de Timor-Leste e em um congresso no mês de novembro de 2008. Infelizmente apenas a biologia havia escrito seu relatório, as outras disciplinas tinham apenas tópicos e por isso o coordenador interino nomeou a professora de matemática como a relatora e todos deveríamos apenas esperar, até a presente data não houve avanços no documento. O que tem se transformado em uma constante na cooperação, iniciar as coisas e não concluir nenhuma, mas como um dia me disse Jailson, eu não deveria ser tão metódico porque aqui no Timor-Leste as coisas caminham diferente, a meu ver profissionalismo deve ser igual em qualquer parte do mundo. A cooperação brasileira precisava ser vista. Os outros países precisam saber o que estávamos fazendo no e pelo Timor-Leste.

O Brasil está presente no Timor-Leste, mas apesar de fazermos o mesmo trabalho educacional dos portugueses, o trabalho deles sempre ganhava mais projeção e aliado a isso, percebemos que tínhamos uma aceitação melhor entre os timorenses do que os portugueses éramos mais abertos ao diálogo, mas nossa interação com a população local exigia a comunicação. A necessidade de saber se expressar no dialeto local, o tétun, se tornara fator de grande relevância para o andamento do projeto. Foi então que a coordenação brasileira ofereceu um curso de tétun na Universidade Nacional do Timor-Leste, funcionaria as terças e quartas, no início da noite, e resolvi assistir algumas aulas, sempre que tinha disponibilidade de tempo, as aulas foram bem proveitosas.

Nos primeiros dias de dezembro de 2008, recebemos a visita da correspondente internacional do SBT na Austrália, a repórter Giovana Vitola, que me escolheu para acompanhar o trabalho da cooperação. Então tive registrado alguns momentos do meu dia-a-dia, desde minha casa até a universidade, onde dou aulas. Confesso que tive receios, mas no final deu tudo certo. Como e quando a reportagem será exibida no Brasil ainda não sabemos.

Estou feliz por estar aqui, apesar da distância da minha família, descobrir aqui uma nova experiência de vida, profissional e pessoal também. O trabalho tem sido muito gratificante, e pelo menos até agora não me arrependi um só dia de ter vindo para cá. A idéia de fazer parte da reconstrução de uma nação desperta em mim, orgulho e fascinação.

PARTE 4

CRONOGRAMA DE TRABALHO

ATIVIDADES

JULHO

2008

AGOSTO

2008

SETEMBRO 2008

OUTUBRO 2008

NOVEMBRO 2008

DEZEMBRO

2008

Curso de capacitação dos professores timorenses no distrito de Ainaro

























Aulas do Bacharelato de Emergência

























Aula na Universidade Nacional Timor Lorosa’e

























Elaboração do livro didático

























Recesso final de ano




















































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